25.10.06

Con-de-na-ção

Numa destas manhãs de primavera, me pego logo após o raiar do sol abrindo a janela para buscar, o mais rápido possível, o cantar dos pássaros numa bela manhã amena de temperatura e rica em sentimentos.
Após o banho, tenho pressa em ir para um parque para ler um pouco boas páginas de um livro interessante. No belo jardim vejo a alegria dos pássaros cantando e se banhando no chafariz e penso que na verdade, os pássaros são criaturas mandadas por D'us para mostrar aos homens como se deve viver a vida neste lugar.
Mas, não temos tempo nem sensibilidade para chegar à alguma conclusão a respeito, somos demasiadamente desumanos, me pego triste por pensar na fraude humana e sua existência.
Num lance de mágica, vejo o reflexo do sol em uma gota de orvalho que cai de uma flor, me pego encantado vendo a bela flor, sua forma, suas cores, sua beleza rara, seu brilho com as gotas de água refletindo o sol.
Aproximo-me, fito comovido a bela criatura, o vento fresco daquela manhã me faz sentir o perfume por ela exalado que me toca fundo em todos os sentidos. Ao tocá-la, vejo a textura de sua pétala e a sensibilidade de seu desabrochar.
Não li mais sequer uma página, passei horas vendo e revendo a bela flor, pensando como eu poderia ter vivido tantas primaveras e nunca ter visto nem sentido o que me transbordava o coração como se fosse um vulcão.
Depois de um instante calado, lágrimas me percorriam o rosto com um sentimento misto de dor e alegria, e não sabia como este pobre homem poderia sentir duas coisas tão antagônicas? Enfim, busquei pensar como seria minha vida após a primavera, tendo que esperar incansável por todas as primaveras.
Peguei-me chocado com o fato de que não conseguiria ficar sem a primavera e nem um dia sequer sem ver a bela flor, que tão frágil, resistia bravamente naquele lugar sujeito as intempéries dos dias e das noites.
Desejei ser o mais poderoso dos homens e decretar que “todos os homens teriam direito à sua primavera perpétua, uma bela flor, poesia e alegria pelo resto de suas vidas.”
Inexplicavelmente o sol desaparece e após um segundo, a flor morre, sua forma e cores já não mais me encantam, me pego desolado por ter construído minha esperança no futuro em suas cores, formas e perfume.
Tentei ler algumas poucas palavras do livro, com os olhos marejados não conseguia ler, fecho o livro e parto para minha casa numa eterna noite pumblea e solitária. Antes de o sono me tomar do soluço pelo choro contido, prometo para mim mesmo, que, se não tive àquela bela flor, me recusarei a andar por qualquer caminho florido, me furtarei a respirar o ar de um belo dia de sol, me negarei a viver outra primavera. Doravante, neste pobre homem habitará a melancolia do outono e o vento gélido do inverno e o sorriso que um dia foi o reflexo de minh'alma, será sepultado em uma noite lúgubre de uma vida infeliz, condenada a viver sem a primavera.
Acordo trêmulo e sonolento, chorando, entendendo que os sentimentos antagônicos que me enchiam o coração, alegria e dor, na verdade era minha maior imperfeição... Havia descoberto o que é amar... Tarde demais, não se ama, sem primavera!!!Condeno-me as tempestades de uma noite eterna.

2 comments:

Gilberto said...

Ca-ra-ca! Muito bom, bom, bom demais. Mas o quê? Ainda é primavera!

Alexandre Magno said...

A descoberta das cores da vida escancara a nossa essência e como a natureza se impõe como condição à felicidade. O Azul existe... queira você ou não. Agora lhe digo uma coisa nada apaga a lembrança de uma manhã banhada de sol... nem apagará duas ou três. Desafie a noite e viva o dia... como diria Machado de Assis as noites velhas quando chegarem, buscaram ao menos o júbilo das antigas noites novas